sábado, 6 de julho de 2019

Estive a ler a Proclamação da Independência de Cabo Verde de 5/7/1975 (amanhã comemora-se a data) que circula pelas redes sociais Infelizmente é um texto em que me assiste, hoje, o direito não me rever nele, e comigo muito mais gente, pela seguintes razões. É claro que nesta data nos meus 13/14 anitos festejei o ano de festas que seguiu o 25 de Abril de 1974 ao 5 de Julho de 1975.
É um texto faccioso e radical que consiste numa uma proclamação de guerra permanente, mesmo deppois de ela ter terminado pelo menos na Guiné, onde alegadamente teriam feito a luta de libertação, um texto antidemocrático, demasiado ideológico, com uma linguagem marxista ultrapassada, cheio de inverdades e banhado numa narrativa Demiurga, em que o PAIGC apresenta-se como Deus ex-machina, o criador de Cabo Verde.
Este texto que poderia ficar para a História, não ficará por isso, a menos que as gerações vindouras sejam desprovidas de total espírito crítico. Infelizmente falta a muitos o tal espírito para repudiar este texto, da forma como está escrita, que já na época era inaceitável para muitos.
O tema desta proclamação é uma verborreia da glorificação da luta armada na Guiné Bissau na qual terão alegadamente participado ao todo uma dezena de cabo-verdianos, muitos na realidade representantes do Paigc em capitais europeias ou africanas. São esses que chegam em Cabo Verde em 1974, totalmente impreparados para o poder, sequer para administrar um tasca, que com ajuda dos jovens imberbes estudantes de Lisboa, num 'empurra para lá', tomam o lugar dos milhares de cabo-verdianos que asseguravam Cabo Verde, expulsando-os para fora do país. As últimas sendo pessoas que davam o litro no arquipélago e que de um dia para outro são acusadas de todos os males (de colonos, lacaios e imperialistas etc). Não tinham mais lugar em Cabo Verde. Exilam-se para Portugal América Brasil etc.
Esta narrativa do Paigc (hoje varrida debaixo da cama) tem pois por isso muitas lacunas, para não chamá-la de fraudulenta!! .
De resto a própria Descolonização tem muito que se lhe diga, já que contrariamente a Angola Moçambique a máquina administrativa e económica era local e cabo-verdiana e não havia colonos. De resto é um facto que a administração colonial na Guiné tinham uma grande coluna cabo-verdiana, e em menor escala em Angola e Moçambique.
A Descolonização de Cabo Verde foi na prática uma operação de saneamento em massa da máquina administrativa autóctone e a limpeza da oposição ao Paigc com o apoio do MFA, quando a oposição que exigia outros caminhos de maior responsabilidade de ambas as partes, inclusivamente o MFA. Exigia que Portugal não entregasse da maneira como ia fazer atabalhoadamente o arquipélago em mãos de aventureiros. Por isso muitos assuntos de importância vital ficaram pendurados ou no armário.
A 'operação Descolonização' deu-se por terminada em 1977 quando o poder instalado tentou desbaratar o remanescente da oposição (na altura constituída por comerciantes do Mindelo que já na altura punham em causa a política económica socialista do novo poder, que centralizava tudo na Praia e que iria dar cabo de SVicente). São estes que vão receber hoje em 2019, e postumamente, a reparação tardia da parte do estado democrático e pacificado de Cabo Verde
Foi durante a ascensão ao poder pelo Paigc que ocorreu durante meses, entre meados e finais de 1974 até a Independência de 5/7/1975, que aconteceu a autêntica debandada dos milhares de cabo-verdianos para a Diáspora e Emigração (fenómeno que ainda hoje perdura) . Foi o princípio do fim da ilha de Svicente, que amanhã precisamente vai de novo manifestar por um melhor desenvolvimento e mais autonomia, paradoxalmente depois do chumbo da Regionalização em Abril passado.
Para além disso o próprio processo que conduziu à independência (ou seja a Transição) tem também muito que se lhe diga, pois Cabo Verde não tinha condições de aceder à Independência em 1975.
A acontecer nunca sem uma longa transição, de pelo menos 10 anos (como praticou a França na Nova Caledónia) e com um Referendo supervisionado pela ONU, depois de tratado todos os assuntos pendentes. Apesar de tudo as populações tinham o direito de exprimir sobre o seu futuro, num processo de tamanha importância, e de serem consultadas independentemente do resultado. A independência a ser tomada tinha que ser feita ordeiramente e num clima de total democracia, transparência e tolerância.
De todo o modo, só depois de reinstalada a máquina administrativa, lançada as bases para um regime democrático, de serenado os ânimos, de infra-estruturado minimamente o arquipélago etc, é que se poderia conceder a Independência, depois, é claro, de referendada democraticamente, 'comme il faut'. O país nasceu, pois, torto em 1974 com um governo do nível de liceais e formado por amadores da 5ª divisão. O drama que se seguiu à Independência não poderia ter acontecido e as réplicas continuam hoje a sacudir a sociedade e a economia cabo-verdianas.

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