sábado, 22 de junho de 2019


COMUNICADO DO MOVIMENTO PARA A REGIONALIZAÇÃO
                                              2010
Este comunicado toma a forma de uma carta a aberta e apelo aos políticos e sociedade civil da Região Norte e de Cabo Verde

    Considerando que o actual modelo de organização político-administrativa do nosso país é o resultado de decisões políticas tomadas ao arbítrio da história e das conjunturas sociais, a expressão da artificialidade de estratégias políticas concebidas segundo os ditames de uma filosofia de Estado autoritário centralizador, que desconstruiu ou fez tábua rasa do que a evolução natural da sociedade e da história havia cimentado ao longo de séculos, e que carece de ser reformado, uma vez demonstrada a sua falta de resposta para os problemas e a sua muito provável incapacidade para fazer face ao futuro que aí vem;

   Considerando que o actual centralismo, com toda a sua perversidade política subjacente, e a concentração das estruturas do poder dirigente numa só ilha, com todos os seus vícios incrustados, exigem séria e urgente reflexão para uma mudança de paradigma tendente à transição para outro modelo de organização da administração pública;
   
      Considerando que a ilha de S. Vicente tem sido uma vítima directa de sucessivas políticas de centralização, que vêm sendo discreta e paulatinamente reforçadas nos últimos 10 anos, e se têm saldado na desertificação humana, no desemprego acentuado, no desmantelamento do tecido sócio-económico da ilha e na sua colocação sob tutela directa do poder central, sendo imperativo rever a actual situação para recolocar nos seus sítios o que a política instrumental desmantelou quando o exercício da democracia não era um direito público consagrado e uma oportunidade de viver e crescer com a pluralidade de todos os concursos da cidadania;
 
   Considerando que não existe uma doutrina uniforme sobre a descentralização, nem verdades axiomáticas sobre esta matéria, muito menos teorias dogmáticas, e que o estudo e o planeamento de uma descentralização/regionalização envolvem uma série de variáveis, que são pertença da substância complexa e multiforme do problema, e que elas são do âmbito político, geográfico, demográfico, económico e histórico-cultural; mas cientes de que a tarefa de reforma do sistema político e administrativo é complexa, com imprevistos e -- incertezas, mas que de modo nenhum nos pode travar o passo que se quer, efectivamente, dar para evitar que o nosso destino ande a reboque das contingências da História, sendo inquestionável que nos compete, como cidadãos livres e seres responsáveis, reflectir sobre a realidade e transformá-la consoante a observação empírica e os ensinamentos;
    Considerando que se iniciou, por iniciativa sobretudo de elementos da diáspora associados ao Movimento para a Regionalização em Cabo Verde, um debate sobre a Reforma Administrativa do Estado envolvendo a Descentralização e a Regionalização que se entendem indispensáveis à realidade cabo-verdiana, debate esse cujo alargamento à escala nacional vem sendo pedido com insistência às instâncias políticas e governativas do país;

     Considerando que, enquanto se assiste à degradação crescente da periferia do país, existe uma proposta de criação de um Estatuto Especial para a Praia a ser submetido brevemente ao Parlamento para a sua aprovação ainda este ano, de par com uma proposta de criação da Região Metropolitana da Grande Praia;
    Considerando que a sociedade civil mindelense e toda a Região Norte parecem mergulhados num clima de apatia social e desinteresse cívico sem precedentes no nosso passado colectivo, que só se explica pela preponderância de valores individualistas e egoístas e pelo apagamento dos líderes políticos locais, divididos em querelas inúteis da baixa política;
    Considerando que todo este cenário de recessão cívica inibe o despertar de energias vitais, a convergência de vontades, o debate e a reflexão séria sobre a actual realidade político-social, para uma tomada de posição firme sobre o futuro da ilha e da Região Norte;
    Perante estes considerandos, os cidadãos abaixo assinados lançam um Apelo veemente aos políticos e à sociedade civil, para que se tomem medidas urgentes e eficazes no sentido de:
    Promover urgentemente um debate amplo e participativo, sem exclusões, sobre a problemática da ilha, da Região Norte, outras ilhas e eventualmente regiões, com vista a traçar linhas para uma acção colectiva e a obter um consenso local e regional sobre o modelo de descentralização e regionalização mais adequado à nossa realidade; 
   Criar uma plataforma de entendimento para a elaboração de propostas concretas sobre o futuro político, administrativo e económico desta ilha, Região,  de outras ilhas e eventualmente regiões;
 Promover estratégias de cooperação e solidariedade para a Região Norte e entre ilhas e regiões.
    Exortamos ainda os partidos políticos, os deputados e o governo a assumirem as suas respectivas responsabilidades, instaurando um verdadeiro debate interno e nacional sobre a Reforma Política e Administrativa do País, a empreenderem iniciativas para promover a Descentralização/Regionalização envolvendo mais intensamente a população, a sociedade civil, os parceiros sociais, económicos e políticos. É importante que se promova a instauração de Estados Gerais para estudar aprofundadamente as matérias atinentes à problemática da Reforma Política e Administrativa do País, que se definam grupos de trabalho para estudar as diferentes experiências de Regionalização/Descentralização no Mundo, que se promovam intercâmbios parlamentares, palestras, seminários e missões envolvendo peritos e especialistas em questões regionais e nacionais, que se implemente um calendário de Regionalização/Descentralização, “O Roteiro da Regionalização/Descentralização”, com metas precisas e definidas.
    Subscrevem este Documento cidadãos cabo-verdianos sem qualquer filiação político-partidária, preocupados com a contínua degradação da situação económico-social e a perda do estatuto político, mormente de S. Vicente e da Região, em que nasceram ou viveram parte significativa das suas vidas, (assim como preocupados) e com a necessidade de uma reforma urgente do sistema político e administrativo de Cabo Verde, bastas vezes prometida e adiada para as calendas gregas.

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