COMUNICADO DO
MOVIMENTO PARA A REGIONALIZAÇÃO
2010
Este comunicado toma a forma de uma
carta a aberta e apelo aos políticos e sociedade civil da Região Norte e de
Cabo Verde
Considerando que o actual modelo de
organização político-administrativa do nosso país é o resultado de decisões
políticas tomadas ao arbítrio da história e das conjunturas sociais, a
expressão da artificialidade de estratégias políticas concebidas segundo os
ditames de uma filosofia de Estado autoritário centralizador, que desconstruiu
ou fez tábua rasa do que a evolução natural da sociedade e da história havia
cimentado ao longo de séculos, e que carece de ser reformado, uma vez
demonstrada a sua falta de resposta para os problemas e a sua muito provável
incapacidade para fazer face ao futuro que aí vem;
Considerando
que o actual centralismo, com toda a sua perversidade política subjacente, e a
concentração das estruturas do poder dirigente numa só ilha, com todos os seus
vícios incrustados, exigem séria e urgente reflexão para uma mudança de
paradigma tendente à transição para outro modelo de organização da
administração pública;
Considerando que a ilha de S. Vicente tem
sido uma vítima directa de sucessivas políticas de centralização, que vêm sendo
discreta e paulatinamente reforçadas nos últimos 10 anos, e se têm saldado na
desertificação humana, no desemprego acentuado, no desmantelamento do tecido
sócio-económico da ilha e na sua colocação sob tutela directa do poder
central, sendo imperativo
rever a actual situação para recolocar nos seus sítios o que
a política instrumental desmantelou quando o exercício da democracia não era um
direito público consagrado e uma oportunidade de viver e crescer com a
pluralidade de todos os concursos da cidadania;
Considerando que não existe uma doutrina
uniforme sobre a descentralização, nem verdades axiomáticas sobre esta matéria,
muito menos teorias dogmáticas, e que o estudo e o planeamento de uma
descentralização/regionalização envolvem uma série de variáveis, que são
pertença da substância complexa e multiforme do problema, e que elas são do
âmbito político, geográfico, demográfico, económico e histórico-cultural; mas
cientes de que a tarefa de reforma do sistema político e administrativo é
complexa, com imprevistos e -- incertezas, mas que de modo nenhum nos pode
travar o passo que se quer, efectivamente, dar para evitar que o nosso destino
ande a reboque das contingências da História, sendo inquestionável que nos
compete, como cidadãos livres e seres responsáveis, reflectir sobre a realidade
e transformá-la consoante a observação empírica e os ensinamentos;
Considerando
que se iniciou, por iniciativa sobretudo de elementos da diáspora associados ao
Movimento para a Regionalização em Cabo Verde, um debate sobre a Reforma
Administrativa do Estado envolvendo a Descentralização e a Regionalização que
se entendem indispensáveis à realidade cabo-verdiana, debate esse cujo
alargamento à escala nacional vem sendo pedido com insistência às instâncias
políticas e governativas do país;
Considerando que, enquanto se assiste à
degradação crescente da periferia do país, existe uma proposta de criação de um
Estatuto Especial para a Praia a ser submetido brevemente ao Parlamento para a
sua aprovação ainda este ano, de par com uma proposta de criação da Região Metropolitana da Grande Praia;
Considerando que a sociedade civil mindelense e toda a Região Norte
parecem mergulhados num clima de apatia social e desinteresse cívico sem
precedentes no nosso passado colectivo, que só se explica pela preponderância
de valores individualistas e egoístas e pelo apagamento dos líderes políticos
locais, divididos em querelas inúteis da baixa política;
Considerando que todo este cenário de recessão cívica inibe o despertar
de energias vitais, a convergência de vontades, o debate e a reflexão séria
sobre a actual realidade político-social, para uma tomada de posição firme
sobre o futuro da ilha e da Região Norte;
Perante estes considerandos, os cidadãos
abaixo assinados lançam um Apelo veemente aos políticos e à sociedade civil,
para que se tomem medidas urgentes e eficazes no sentido de:
Promover urgentemente um debate amplo e
participativo, sem exclusões, sobre a problemática da ilha, da Região Norte, outras
ilhas e eventualmente regiões, com vista a traçar linhas para uma acção
colectiva e a obter um consenso local e regional sobre o modelo de
descentralização e regionalização mais adequado à nossa realidade;
Criar uma plataforma de entendimento para a
elaboração de propostas concretas sobre o futuro político, administrativo e
económico desta ilha, Região, de
outras ilhas e eventualmente regiões;
Promover estratégias de cooperação e
solidariedade para a Região Norte e entre ilhas e regiões.
Exortamos ainda os partidos políticos, os
deputados e o governo a assumirem as suas respectivas
responsabilidades, instaurando um verdadeiro debate interno e nacional sobre a
Reforma Política e Administrativa do País, a empreenderem iniciativas para
promover a Descentralização/Regionalização envolvendo mais intensamente a
população, a sociedade civil, os parceiros sociais, económicos e políticos. É
importante que se promova a instauração de Estados Gerais para estudar
aprofundadamente as matérias atinentes à problemática da Reforma
Política e Administrativa do País, que se definam grupos de trabalho para
estudar as diferentes experiências de Regionalização/Descentralização no Mundo,
que se promovam intercâmbios parlamentares, palestras, seminários e missões
envolvendo peritos e especialistas em questões regionais e nacionais, que se implemente
um calendário de Regionalização/Descentralização, “O Roteiro da Regionalização/Descentralização”,
com metas precisas e definidas.
Subscrevem este Documento cidadãos
cabo-verdianos sem qualquer filiação político-partidária, preocupados com a
contínua degradação da situação económico-social e a perda do estatuto político,
mormente de S. Vicente e da Região, em que nasceram ou viveram parte
significativa das suas vidas, (assim como preocupados) e com a
necessidade de uma reforma urgente do sistema político e administrativo
de Cabo Verde, bastas vezes prometida e adiada para as calendas gregas.
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