segunda-feira, 5 de junho de 2017

Quo Vadis Regionalização de Cabo Verde: PAICV e MPD entendem-se sobre uma Nova Proposta consensual? (Um artigo de opinião)

Introdução
Neste artigo, em duas partes, opino sobre o processo de Regionalização de Cabo Verde, de acordo com a última Proposta. Exprimo aqui uma opinião pessoal, que não vincula mais ninguém, apesar de eu pertencer ao Grupo de Reflexão para a Regionalização, mais especificamente, o Grupo de Reflexão da Diáspora.


É preciso lembrar que a Regionalização está inscrita na realidade cabo-verdiana. Com os descobrimentos os navegadores portugueses dividiram o arquipélago em duas regiões naturais: as ilhas de Barlavento, ou ilhas de onde sopra o vento e as ilhas de Sotavento, ou ilhas para onde o vento se dirige. Para além de mais, existem regionalismos climáticos no arquipélago de Cabo Verde: ilhas do sul com climas mais tropicais e ilhas do norte mais temperadas, assim com ilhas áridas, com paisagens desérticas. Dentro de uma mesma ilha, pode existir microclimas, áreas onde se cultivam plantas mediterrânicas tais como a vinha (logo produz-se vinho), ou com ‘florestas’ de pinheiro, invulgares para estas latitudes. Se inicialmente a colonização das ilhas deu-se pelo Sul, com as ilhas de Santiago, Fogo e Brava a serem as primeiras povoadas, já as outras ilhas do Norte, que foram povoadas mais mais tarde, tiveram uma evolução sociológica e histórica bem diferente. S. Vicente povoa-se muito recentemente e torna-se o paradigma do novo Cabo Verde, que se abria ao Mundo, graças ao Porto-Grande do Mindelo e aos serviços de apoio à frota britânica, assim como às centrais de telecomunicações intercontinentais instalados na ilha. Em meados do século XIX a ilha torna-se praticamente a nova capital cabo-verdiana que atrai populações de todas as ilhas e do mundo, e distingue-se pelo seu cosmopolitismo. A partir deste novo pólo vai nascer uma forte identidade na região norte do arquipélago, a que se associa Barlavento, uma área de grande dinamismo sociocultural, ao passo que Sotavento, com a pacata capital Praia, estagna-se até 1975, ano em que o PAIGC, novo poder em Cabo Verde, decreta o fim da antiga realidade e o início de uma nova. Traz com ele o conceito centralista de estado-nação de tipo continental, que se opõe à natureza diversa, arquipelágica regional ou regionalizada. Cria-se o novo paradigma de Cabo Verde no qual proíbe-se qualquer alusão ao regionalismo. Os termos geográficos Barlavento e Sotavento são tabus e mesmo banidos dos mapas oficiais. O debate abafado sobre o regionalismo, só reaparece com a democracia e o fim do Regime de Partido Único em 1992. Todavia na altura não havia uma ideia nem um conceito preciso daquilo que podia ser a regionalização. De resto ainda hoje, mesmo nos círculos sociopolíticos os mais eruditos, é confundida com municipalismo. Há mesmo quem nalguns sectores liberais do MPD defenda, erradamente, que o problema da regionalização só surge por razões do mau modelo de desenvolvimento, e que a aplicação em Cabo Verde de uma receita liberal ou neoliberal, acabando de vez com a dependência do Estado, mataria a questão regionalização.
Na realidade, o verdadeiro debate sobre a Regionalização só começa à partir da primeira década de 2000, graças à contribuição determinante de uma certa Diáspora esclarecida e progressista, na qual me inscrevo. Só a partir desta data aparece em cima da mesa conceitos e modelos diversos em debate: o modelo de Ilha Região e vários modelos de agrupamento de ilhas, até mesmo a ideia de transformar Cabo Verde numa federação de ilhas ou regiões soberanas. Em todo os casos ressurgem as duas regiões naturais no arquipélago: Barlavento e Sotavento, havendo mesmo quem defenda uma 3ª região, a região Centro, que deveria incluir as ilhas turísticas integradas, Sal e Boavista, portanto com uma forte identidade económica.
Continua em (1ª parte- Da socializalização da Proposta de Regionalização do Governo/MPD à socialização do PAICV à Regionalização)
20 de Maio de 2017

José Fortes Lopes

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