CORDÁ MINDLENSE
PÁ SONCENT CÁ MURCHÁ
Cidadãos do Mindelo!
Desde
há muito que o conformismo e o absentismo se instalaram entre nós amolecendo o nosso
ânimo colectivo e roubando-nos um olhar crítico sobre o que se passa à nossa volta.
Nem com a nossa ilha mergulhada numa inércia negativa sem precedentes, afastada
do xadrez político em que se joga o futuro do país, damos sinais de despertar
para a urgente necessidade de tomarmos nas mãos a alavanca do nosso destino!
A
independência nacional trouxe-nos uma dinâmica transformadora em muitos
sectores das nossas vidas, mas de forma insidiosa a ilha de S. Vicente foi menorizada
no projecto político do futuro do país. Incompreensível! Como se a nossa ilha
não tivesse sido o palco da revolução industrial e da modernidade no território
e a principal fonte de receita da colónia a partir da emergência do Porto
Grande! Como se nela não tivesse também dado à luz a maior parte da “intelligentsia”
cabo-verdiana! Aquela que deixou ao povo das ilhas o legado intelectual que
haveria de despertar a sua consciencialização política.
Por
tudo isso, espanta o retrocesso sofrido por S. Vicente, em que o desemprego
dispara para níveis preocupantes e em que a esperança parece trancada no olhar
dos nossos jovens. Um verdadeiro paradoxo, tendo em conta o passado da ilha, as
suas reais potencialidades, a sua capacidade demográfica e a massa crítica que,
apesar de tudo, ela ainda comporta no contexto nacional!
As
razões da situação de degradação da nossa ilha são indiscutivelmente de
natureza política. Desde logo, é consequência directa de um Estado que
centralizou a política nacional e se concentrou totalmente na capital do país.
Fenómeno que não seria por si só determinante se não catalisasse as prioridades
do investimento oficial sempre em benefício da mesma ilha e da mesma cidade.
Sim,
a causa é eminentemente de ordem política. Mas isso só se deve ao
desvirtuamento dos seus princípios e da sua prática, que é o que acontece
quando a lógica do aparelhismo partidário se sobreleva aos interesses dos
cidadãos e das ilhas em nome dos quais se confrontam ideias e se disputam eleições.
Todavia, a rédea livre permitida aos vícios do aparelhismo só ocorre quando a
cidadania se divorcia do papel que lhe cabe na vida comunitária. Quem cala
consente, costuma-se dizer. Ainda assim, não é provável que estejamos irremediavelmente
“intepid de medo”, como dizia o celebrado concidadão Nhô Djunga nas suas
crónicas.
Perante
este cenário deprimente, a cidadania exige-nos, pois, uma atitude manifestamente
proactiva, para que os políticos deixem de ser os únicos fautores do nosso
destino. As formações políticas são úteis e necessárias, é verdade, mas não
podem dispensar ao cidadão uma permanente vigilância cívica e uma postura
crítica, bem como o contributo das ideias que todos e cada um de nós podemos e
devemos carrear para melhorar as decisões sobre a nossa vida comum. Semelhante compromisso
implica influenciar as decisões do governo central através dos deputados que representam
a nossa ilha, que têm de ser espevitados para abandonarem o laxismo e a
obediência canina ao aparelho partidário, para serem uma voz audível e
inconformada do povo que representam.
O
poder político que nos é mais próximo é a Câmara Municipal, daí que não pode
continuar a verificar-se a situação de costas viradas em que praticamente vivem
os cidadãos e o município. O despertar da cidadania na nossa ilha deve, pois,
visar em primeira mão a autarquia, exigindo veementemente que ela se abra mais
aos munícipes, que ouça as suas propostas e sugestões, que dialogue e discuta
com eles as linhas essenciais das decisões críticas sobre a cidade e a vida
comunitária. E que esclareça sempre e sem peias os actos de gestão que se
revelem nocivos ou suscitem rumor público sobre procedimentos duvidosos ou
contrários à lei.
Com
efeito, em S. Vicente tem de despontar uma nova atitude cívica, que se afirme
em todos momentos e circunstâncias e produza eco em todo o país. Os mindelenses
têm esse dever e essa responsabilidade porque não podem jamais ignorar que são
guardiães do importante património cultural que foi o Movimento Claridoso! E não
foi por acaso que esse movimento teve aqui o seu berço. S. Vicente congrega e
harmoniza as diferentes idiossincrasias nacionais e até pode dizer-se sem
rebuço que a ilha é o verdadeiro paradigma da cosmovisão que caracteriza a alma
cabo-verdiana. Deste modo, o povo da ilha onde se fermentou a consciencialização
política nacional e onde se travaram as lutas cívicas mais determinantes para o
futuro de todos, não pode deixar os seus pergaminhos por mãos alheias!
Cidadãos do
Mindelo!
É
hora de acordar para fazer valer a nossa voz indignada e inconformada.
Ao Governo da República, exige-se a rápida implementação
de um modelo de descentralização do poder que a breve trecho se torne via para
uma efectiva autonomia política da ilha de S. Vicente. Particularmente,
exige-se aos deputados pela nossa ilha uma atitude política mais consentânea
com os deveres que a Constituição lhes prescreve e que a sua consciência devia
recomendar.
À Câmara Municipal de S. Vicente, exige-se que seja o primeiro
escalão da luta do povo de S. Vicente em prol dos seus direitos e tendo em
vista a concretização dos seus anseios de progresso material e espiritual.
Neste campo, há que concertar com o Governo as políticas que reduzam o
desemprego que grassa na ilha, afectando principalmente a juventude, e outras
que resolvam os problemas sociais mais candentes, com especial atenção à
infância e à velhice, como forma de pôr cobro a situações degradantes como a
mendicidade nas ruas, a prostituição de menores e a carência alimentar nos
lares mais desprotegidos. No âmbito das suas competências directas, espera-se
da edilidade uma atitude mais dinâmica e actuante nas áreas que seguir se
discriminam sintetizando:
- Na área da Cultura: criação de bibliotecas e centros
culturais distribuídos pela cidade e outras comunidades sociais da ilha; fomento
do desporto criando os apoios necessários à sua prática em várias modalidades, resolução
do problema da falta de um cinema ou casa de espectáculos que se verifica desde
o fim do Eden Park; auscultação dos munícipes antes do planeamento de
festividades tradicionais e outras, para evitar decisões e escolhas do pelouro
da cultura que não respeitem as nossas especificidades culturais e musicais;
- Na área da Educação: reabilitação da formação técnico-profissional,
como resposta possível e adequada à resolução do problema do desemprego;
- Na área Económico-Social: incentivo ao envolvimento mais
intenso do sector empresarial privado de S. Vicente, identificando casos de
excelência que possam ser replicáveis, estimulados e evidenciados no exterior,
concitando parcerias em áreas afins; apoio ao desenvolvimento crescente de
empresas que se distingam pela criatividade; valorização e enaltecimento
público dos casos de sucesso empresarial que se destaquem pela sua exemplaridade;
por último, atenção especial aos nossos emigrantes, recebendo-os condignamente,
facultando-lhes horários de atendimento mais alargados nas repartições públicas
e criando-lhes estímulos para investirem na sua ilha natal.
Cidadãos
do Mindelo, em cada um de nós mora o espírito indómito do “Capitão Ambrósio”, aquele homem simples que arvorou a bandeira
negra da fome e com ela brandida marchou à frente do povo pelas ruas da cidade.
É hora de o despertar! É hora!!!
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