S. VICENTE: UM CASE STUDY PARA UM POSSÍVEL MODELO DE
REGIONALIZAÇÃO E AUTONOMIA EM CABO VERDE (II) - A REGIONALIZAÇÃO OU UM NOVO MODELO DE ORDENAMENTO DO
TERRITÓRIO NACIONAL
(SECÇÃO B)
MODELOS DE REGIONALIZAÇÃO IMPLEMENTADOS NO MUNDO
Dando
continuidade à abordagem da problemática da Regionalização iniciada nos artigos
anteriores, propomo-nos agora, conforme prometido, passar em revista os
diferentes modelos de Regionalização implementados em vários países do mundo.
A Regionalização-Descentralização
que definimos como autonomia política, administrativa e económica será
talvez a regionalização de que falam os
políticos e que desejam os cabo-verdianos. É a descentralização
efectiva, com transferência de poderes e competência do poder central para as
ilhas, através da definição do estatuto de autonomia como entidade política.
Propomos assim romper com o actual modelo
centralizador, que de certa forma herdamos de Portugal, e que é um misto do
modelo burocrático napoleónico (que a própria França ultrapassou) e do
centralismo democrático gerado no próprio país. Pretendemos aqui informar o
melhor possível o público cabo-verdiano sobre a Regionalização, informação essa
que a classe política cabo-verdiana lhes omite ou mesmo deturpa, para que a
perpetuação dos privilégios associados ao centralismo não seja posta em causa.
Diversos modelos de Regionalização vêm
funcionando desde há muitas décadas, em vários países do mundo, sem pôr em
causa o chavão da Unidade Nacional, que os detractores cabo-verdianos da
Regionalização acenam com frequência e logo que se perspectiva o mínimo debate
sobre esta matéria. A maior parte das democracias ocidentais modernas cedo foi
confrontada com a problemática das questões nacionais, por elas possuírem no
seu seio situações diversas de descontinuidades geográficas, culturais, etc.
Estas contradições foram exacerbadas pela tendência natural para o
“centralismo” do Estado Central, mesmo em regime democrático. Para minimizar os
problemas advindos da força centrípeta do poder central e das tensões que este
efeito cria nas suas periferias, implementaram-se diversos modelos de
Regionalização, que constituem, na prática, sistemas de contra-poderes ao
centralismo estatal, funcionando assim como verdadeiro antídoto aos seus excessos da burocracia
centralizadora. Esta foi a receita bem conseguida na maioria dos países da
Europa ocidental, nomeadamente a Alemanha, a Suíça, a França, a Espanha, etc, e
mesmo em Portugal com a Madeira e os Açores. A Regionalização não é, portanto,
um papão, o fim do Estado central, como muitos ideólogos pretendem, mas talvez
uma nova oportunidade para renovar a democracia cabo-verdiana, tendendo, por um
lado, à consolidação de uma democracia plena, aproximando os cidadãos de um poder
local forte, e, por outro lado, melhorando e aligeirando o funcionamento do
Estado, tornando-o menos limitador, menos controlador e menos castrador das
energias cidadãs.
Em seguida, apresento vários exemplos de
modelos de Descentralização implementados no mundo, que nos
poderão inspirar:
− As Autonomias
Espanholas (1,2)
A Constituição
Espanhola de 1978 reconhece a existência de regiões e nacionalidades, e
concede-lhes a autonomia sem estabelecer diferenças administrativas entre elas.
Ela fundamenta-se na indissolúvel unidade da nação espanhola, pátria comum e
indivisível de todos os espanhóis, mas reconhece e garante o direito
inalienável à autonomia das nacionalidades e regiões espanholas que a integram,
assim como solidariedade entre todas elas. O Poder Político em Espanha está
organizado como um Governo Central e 17 Governos Regionais denominados Comunidades Autónomas. These
regional governments are responsible for the administration of schools,
universities, health, social services, culture, urban and rural development
and, in some cases, policing. There are
also 2 autonomous cities .
Esses governos regionais estão dotados de poderes muito alargados, sendo
responsáveis pela administração territorial, pela gestão do sistema de saúde,
da segurança sociais, da cultura, do planeamento e do desenvolvimento urbano e
rural, pela gestão das escolas, das universidades, e, em geral, pela segurança
territorial. Existe em Espanha duas cidades
autónomas.
− A Federação
Suíça (3)
A Suíça é um
Estado Federal desde 1848,Each with its
own borders, army and currency from the (1648)
until the establishment of the Swiss federal state in 1848. formado por
cantons (o nome deriva da palavra francesa Canton que tem o
significado de distrito), cuja
superfície pode variar entre 37 km ² e 7,105 km ² e com populações variando entre 15.471 e 1.244.400. Os Cantons são estados
propriamente ditos, uma realidade herdada do Tratado de Westfália (1648), onde
cada Canton já era na prática um Estado
soberano, com suas próprias fronteiras, exército e moeda. The most recently
created canton is the in 1979. Na actual Constituição, cada Canton continua
soberano, com a sua própria constituição, legislatura, governo e tribunais, na
medida em que sua soberania não é limitada pela lei federal. Assim, excluindo
os poderes atribuídos pela Constituição Federal ao Poder Central, os cantões
possuem assim um leque importante de poderes e competências atribuídos aos
governos cantonais eleitos, e gozam de plena soberania, na área do ordenamento
territorial, da segurança local, da saúde, da economia e finanças locais etc.
− A Federação Alemã
(4,5)
O estado federal
alemão é uma entidade complexa, carregada de História e Tradições, que pretende
combinar as vantagens de um estado unificado com as de um estado federado. A
Alemanha é um Bundesland,
um estado federado composto por dezasseis Estados ( Länder ou Land). Enquanto que a Baviera, Saxónia e Turíngia
são considerados oficialmente Estados (Staat) e mais especificamente
"Estados Livres" (Freistaat), Berlin, Hamburgo e Bremen formam
Cidades-Estados (Stadtstaaten). A definição do Estado-Livre (Freistaat)
é associada ao conceito histórico da república, uma descrição usada pela
maioria dos estados alemães após a abolição da monarquia. Today, Freistaat
is associated emotionally with a more independent status, especially in
Bavaria. Hoje, o Freistaat continua, no imaginário
político, associado a um certo conceito de independência, especialmente na
Baviera. The
remaining 13 states are called Flächenländer (literally: area
countries).Os restantes 13 estados alemães são chamados Flächenländer
(literalmente ‘países da área’). Ainda nos dias de hoje, o sistema federal
alemão continua a ser estudado e aperfeiçoado de modo a reforçar a capacidade
administrativa e fiscal de cada Estado (Länder),
pelo que existem ainda diferenças significativas entre o modelo alemão e os
modelos mais simplificados em vigor noutras partes do mundo. Mas, na prática, e é o que nos interessa
aqui, é que a Lei
Básica Alemã
estabelece as competências claras no âmbito do Governo
Federal e dos
diferentes Estados (Länder) que constituem
a federação, de modo que basicamente o sistema Federal Alemão é também, pelos
seus resultados, muito semelhante ao dos outros modelos. Embora, a vida pública do cidadão alemão seja predominantemente
baseada nas leis do Estado Central Alemão, a plica-se o princípio da subsidiariedade, que
consiste no facto de o cidadão ter a possibilidade de resolver todos os seus
problemas quotidianos, associados à burocracia do Estado Central,
exclusivamente a nível local, através das autoridades locais de cada Estado (Länder), este agindo em nome do Estado
Central Federal. Ou seja, na maior parte das transacções entre o Cidadão e o
Estado Central, este é invisível ou transparente para o cidadão, só conta o
Estado Local (Länder).
A constituição alemã concede ainda uma margem de manobra considerável a cada
Estado no financiamento de suas funções de soberania. (Länder). Os
impostos são divididos entre o governo central e cada Estado (Länder), uma outra particularidade do Estado
Federal Alemão, não se assemelhando assim ao Estado francês ou português. Para
além disso, o Estado (Länder) pode celebrar
tratados com países estrangeiros, em assuntos de sua própria esfera de
competência, desde que isso não interfira ou colida com os interesses ou
poderes do Governo Federal (artigo 32 º da Lei Básica).
A maioria dos impostos é decretada pela lei de cada Estado
− A Federação Americana-EUA (6)
Os Estados
Unidos da América (EUA) formam um Estado Federal constituído por 50 Estados que
compartilham a soberania com o Governo Central Federal. Because
of this shared sovereignty, an American is a citizen both of the federal entity
and of his or her state of Devido a esta particularidade sui
generis, um americano é tanto cidadão da entidade federal como do seu
estado de domicílio. The allocates
certain powers to the federal government. A Constituição dos
Estados Unidos atribui vários poderes e limitações ao Governo Federal e a cada
Estado, numa filosofia muito similar à dos modelos acima descritos. It also
places some limitations on the state governments.O Congresso pode
admitir a adesão aos EUA de novos Estados em pé de igualdade com os já
existentes, o que aconteceu em 1959 com a admissão do Alaska e do Hawai. .A Constituição é omissa sobre a
questão de se os Estados poderem separar-se unilateralmente da União, mas a
Suprema Corte decidiu que secessão é inconstitucional, uma posição impulsionada
em parte pela trágica memória da Guerra
Civil. Ao governo de cada Estado está alocado um amplo leque de competências
associadas ao exercício da sua soberania, e inscritos na respectiva
constituição.By
ratifying the United States Constitution, the people transferred certain powers to the federal government from their
states. Historicamente, as tarefas de segurança pública (no
sentido do controlo do crime), educação pública, saúde pública, transporte e
infra-estruturas são geralmente da
responsabilidade de cada Estado, mas devido ao crescente reforço do financiamento
federal, nota-se, desde há algum tempo para cá, um significativo aumento da
regulação federal em certas áreas de funcionamento dos Estados.
Finalmente, podíamos citar outros exemplos
de Regionalização em países democráticos situados fora do hemisfério ocidental,
tal como o Brasil, país que nos é muito próximo. O Brasil (7) é uma República
Federativa - República Federativa do Brasil - composta por 26 estados.
Inclui-se ainda um distrito federal, onde se situa a capital do país -
Brasília, sede do governo e dos poderes executivo, legislativo e
judiciário. Os diferentes Estados
brasileiros estão ainda agrupados em cinco grandes regiões
político-administrativas: Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste. O Brasil é assim um país duplamente Regionalizado. Tal como nos
EUA, cada Estado possui um leque importante de poderes e competências
atribuídos ao governo estadual, gozando assim de uma ampla soberania em áreas
similares, como ordenamento territorial, segurança, saúde, economia etc. Apesar disso, o Brasil não constitui um
modelo perfeito de descentralização, pois a centralização política é ainda
grande, devido à herança do centralismo colonial e das ditaduras militares,
sendo que a autonomia de cada Estado é
ainda limitada e muito aquém dos níveis de descentralização das democracias
ocidentais atrás referidas. Do ponto de vista prático, o Brasil tem ainda um
longo caminho a percorrer e o mesmo se pode dizer de outros países do mundo
onde a Regionalização foi implementada.
Pode-se concluir desta exposição que,
partindo da experiencia dos modelos em vigor em várias partes do mundo, é
possível implementar em Cabo Verde um modelo original, moderno e progressivo,
de ordenamento do território nacional.
Ficou aqui demonstrado que a dimensão geográfica e demográfica reduzida de um
país não constitui uma impossibilidade, nem pode ser determinante na decisão da
Regionalização de Cabo Verde, como alguns pretendem. A contradizer esta tese
está a Regionalização bem conseguida de um pequeno país como a Suíça. Tão pouco
a fraca dimensão económica de um país pode ser determinante. A prova é que S.
Tome e Príncipe, um país muito mais pobre do que Cabo Verde, adoptou a
Regionalização, com a gestão da ilha do Príncipe assumida por um Governo
Regional para a respectiva ilha.
No modelo de
Regionalização que o Movimento para a Regionalização de Cabo Verde (8) propõe,
a gestão de cada ilha ficaria a cargo de um Governo Regional, se assim
convier vir a ser chamado, saído
de uma maioria parlamentar escrutinada em eleições legislativas, com plena
autonomia política, administrativa e económica inscrita na Constituição. No
topo hierárquico desta arquitectura, estaria o Governo Central, com novos
poderes bem definidos por uma Constituição Nacional revista.
Resta aos
partidos tomar as suas respectivas responsabilidades, instaurar um verdadeiro
debate interno sobre a Regionalização e promover em seguida um debate nacional
sobre a questão. A classe política, incluindo os deputados,
não será paga para pensar Cabo Verde? “Eh bien” que o façam: que promovam um
debate nacional sobre a Regionalização/Descentralização, que procurem envolver
mais intensamente todos os parceiros sociais, económicos e políticos num debate
alargado `a toda a sociedade civil, que promovam a instauração de Estados
Gerais para estudar aprofundadamente a matéria da Regionalização, que definam
grupos de trabalho para estudar as diferentes experiências de
Regionalização/Descentralização no Mundo, que promovam intercâmbios parlamentares,
palestras, seminários e missões envolvendo peritos e especialistas em questões
regionais e nacionais etc, que Implementem um calendário de
Regionalização/Descentralização, “O Roteiro da
Regionalização/Descentralização”, com metas precisas para Reforma Política e
Administrativa do País.
(continua)
José Fortes Lopes
(5)http://www.tatsachen-ueber-deutschland.de/en/political-system.html
(7)
http://www.brcactaceae.org/brasil.html
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